quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Feira livre profissionaliza a gestão para sobreviver


O feirante Michel Coelho tem consciência de que é diferente da maioria de seus colegas. Aos 34 anos de idade, 22 deles passados em feiras livres, ele faz parte da nova geração de profissionais que está modernizando o segmento que permanecia ancorado na informalidade e na administração intuitiva.

Vestido com camisa branca de algodão, calça jeans de grife e sapatênis, o paulista sabe como driblar as caixas de frutas, peças de bacalhau e estrados apinhados de legumes até voltar para casa, por volta das 19h, com a roupa aprumada, exatamente como estava ao pisar na Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp), às 6h.


O cuidado com a aparência é apenas um dos traços das mudanças. Formado em direito e preocupado com técnicas de administração, Coelho procura trazer tecnologia, recursos de logística e de recursos humanos para alavancar a rentabilidade e o volume de vendas do negócio.

Iniciativas que redobram os ânimos de um segmento secular e que, há duas décadas, sofre com a fuga de consumidores para novos canais de venda, notadamente os supermercados e varejões de bairro especializados, chamados de "sacolões".

Investimento. "Se a nossa categoria não inovar, vai perder ainda mais clientes", afirma o empreendedor, que coordena uma estrutura de 12 barracas e atua em cerca de 60 feiras livres na capital todas as semanas. Um empreendimento que movimenta cerca de R$ 700 mil ao mês, emprega aproximadamente 100 pessoas e traz de retorno ao pequeno empresário a média mensal de R$ 7 mil, livre de impostos.

"Eu fico de olho para ver o que podemos fazer e ainda não fizemos", conta ele, que recentemente adquiriu três caminhões novos para descentralizar a montagem das barracas. A estratégia por trás do investimento é ampliar a eficiência em dois momentos chaves do negócio: a preparação da feira e a dinâmica do atendimento.

"Temos uma equipe que vai na frente, monta as bancas, carrega com as mercadorias e depois recolhe tudo. Ganhamos em agilidade e nosso vendedor não precisa acordar de madrugada. Ele chega um pouco antes dos clientes e descansado para trabalhar", diz.

Escritório. O modelo de atuação centrado na gestão não é diferente do incorporado por Carlos Humberto Ruiz. Vindo de uma família de feirantes, ele é dono de 10 barracas de frutas.

Para manter a operação, que também lhe rende entre R$ 600 mil a R$ 700 mil brutos ao mês, Ruiz foi buscar inspiração no modelo corporativo. Para tanto, alugou uma sala dentro da Ceagesp e, lá, instalou um escritório com departamento financeiro e até apoio de recursos humanos.

Desde então, o empresário não trabalha mais no meio de feira. Seu expediente, que também começa por volta das 6h, é dividido entre a supervisão das compras nos distribuidores da Ceagesp e a tabulação dos resultados de cada barraca atrás de uma mesa, com telefone, computador, ar-condicionado e conforto.

"O que tenho aqui é uma empresa como qualquer outra. Recebo os fechamentos de caixas diários das barracas, monitoro compras e penso no que fazer para melhor a venda em uma feira que não está tão bem", destaca.

Foi assim, no silêncio do escritório, que Ruiz planejou e introduziu as máquinas sem fio para pagamentos com cartão de crédito e débito em suas barracas. A inciativa, conta ele, impactou rápido e diretamente nos resultados. De quebra, conseguiu resolver um problema antigo de cheques sem fundo.

"Para não perder a venda, a gente aceitava cheques, que as vezes voltavam. Com o cartão, resolvemos esse problema e aumentamos em até 30% o volume de vendas", afirma.

Sobrevivência. O professor Nuno Fouto, coordenador de pesquisas do Programa de Administração de Varejo da FIA, destaca a busca dos feirantes pela modernização como a via fundamental para o setor sobreviver.

Para ele, ou o feirante tenta se reinventar ou corre o risco de perder ainda mais espaço para os supermercados.

Com a ascensão feminina ao mercado de trabalho, as mulheres deixaram de frequentar a feira durante a semana e a passaram a utilizar os estabelecimentos por causa da praticidade.

"A tecnologia e o investimento em gestão podem trazer uma vantagem grande para o feirante. A tendência é que a feira reduza cada vez mais seu espaço nas grandes cidades. Procurar alternativas para atrair e fidelizar o cliente deve ser a tônica daqui para frente."

Outro desafio do empresário, afirma o especialista, é o investimento na eficiência. Nuno Fouto destaca que os profissionais devem aprender a ampliar as margens para se adequar a uma nova realidade. "A feira ainda é um grande negócio. Mas está mais competitivo."

Fouto explica na teoria o que Jaime Kanashiro descobriu na prática. Dono de uma barraca de pastéis há 35 anos, Kanashiro percebeu que precisava mudar quando o consumo desacelerou. "Antes eu vendia mil pasteis rapidinho. Agora, preciso trabalhar mais e, mesmo assim, conto nos dedos o dia em que chego nesse número", declara.

A estratégia de Kanashiro para minimizar as perdas foi montar uma cozinha industrial e contratar funcionários. "Com isso, nem eu, nem minha mulher perdemos tempo fazendo pastel. Eu trabalho nas vendas e ela cuida das nossas contas", explica.

“Pois é. Até feirante tem que reaprender a vender. O mundo das vendas mudou mesmo. “Eduardo Faddul

Por: Renato Jakitas


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